16/04/2020 – Nada mais intolerante, no ambiente de convivência democrática, do que práticas abusivas seja contra quem for, mais ainda quando expressa uma medida de força do Estado, ao arrepio da lei.

Leis existem para serem cumpridas e, se aqui e ali, nessa ou naquela circunstância, se mostram inadequadas, social e economicamente, cabe pressão para seu aperfeiçoamento ou revogação.

Assim é que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina vem de anular decisão do PROCON da capital catarinense (TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE Nº 5031848-07.2020.8.24.0023/SC) que tabelou em 20% a margem máxima de lucro dos Postos de Combustíveis daquela cidade, dizendo se apoiar no artigo 39, X, do Código de Defesa do Consumidor. E a partir dai passou a interditar estabelecimentos que, na avaliação do órgão, descumpriam aquele” teto” de rentabilidade.

GestãoNada mais absurdo sob qualquer prisma. Primeiro, os preços são livres no mercado de combustíveis. “Desde 2002, vigora no Brasil o regime de liberdade de preços em toda a cadeia de produção, distribuição e revenda de combustíveis e derivados de petróleo. Isso significa que não há qualquer tipo de tabelamento nem fixação de valores máximos e mínimos (grifo nosso), ou qualquer exigência de autorização oficial prévia para reajustes” – informa a ANP, Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, órgão regulador do segmento.

Isso, por si só, seria o suficiente para evidenciar a intervenção abusiva, ilegal, do Procon.

Segundo: a prática de preços no mercado de revenda de combustíveis está sujeita a uma intensa competição dada pela presença de muitos estabelecimentos. Ninguém neste mercado tem as mãos absolutamente livres para impor um preço que resulte no aumento da margem bruta (preço de aquisição menos preço final de venda ao consumidor). Se assim o fizer, é certo que, como regra geral, vai perder clientela.

A despeito, há quem julgue predominar combinação de preços entre os Postos. Falso! Quem souber denuncie aos órgãos de fiscalização e controle para que o fraudador da livre concorrência seja severamente punido, se fato comprovado.

O preço médio da gasolina em Florianópolis, na semana de 05 a 11 do mês em curso, ficou em R$ 4,186, segundo levantamento da ANP, tendo variado de R$ 3,999 a R$ 4,269, em 36 postos pesquisados.

Terceiro: contrariamente, o empresário do Posto nada, ou muito pouco, pode fazer sobre a flutuação dos custos de sua planilha. Ele não controla nem o preço, nem as condições de pagamento que a distribuidora (em número bem menor que o dos postos) vai cobrar pelo combustível faturado.

Há, aqui, uma evidência de poucos percebida: o posto é o elo visível da cadeia de fornecimento, sobre quem se despeja toda sorte de crítica e rotulações.

Tampouco o operador do Posto incide nos impostos cobrados pelo poder público sobre o preço da gasolina, do diesel etc. Por exemplo, a Secretaria da Fazenda de Santa Catarina fixou o PMPF (também conhecido como preço-pauta) da gasolina em R$ 4,100 para o período de 16 a 30 de abril. É sobre esse preço que vai incidir o ICMS de 25% cobrado pelo Estado. Aí está um balizador do preço ao consumidor. O Posto que vender a gasolina nesse período por um preço inferior àquele arbitrado pelo PMPF (R$ 4,100) vai perder dinheiro. Ilustrando: um posto “X” de qualquer município de Santa Catarina decide cobrar R$ 4,00 do consumidor, mas o posto vai pagar ICMS de 25% sobre R$ 4,100.

E assim por diante para a maioria dos custos que formata o preço final oferecido ao consumidor.

Quarto: esse é um mercado tão intensamente regulado por órgãos de fiscalização e controle do Estado quanto vigiado pela mídia e a opinião pública, de modo que qualquer variação para mais no preço da gasolina, em especial, logo é objeto de especulações, em geral descabidas.

Quinto: a rentabilidade do segmento depende inevitavelmente do volume de combustível vendido, o que, por sua vez, guarda relação direta com o preço praticado. Fora disso não há salvação.

E por aí vamos.

Uma operação tão complexa não pode ser avaliado apenas pela métrica da análise de Notas Fiscais emitidas pelas distribuidoras aos postos adquirentes de seus combustíveis.

Não pretendo sugerir que o atacado e o varejo de combustíveis sejam um mercado perfeito. Não o é, nem para o consumidor, que, por vezes, é penalizado por “posteiros” inescrupulosos, picaretas. Nem tampouco o é para o empreendedor que aí opera. Frequentemente, o seguimento se vê atordoado por preços artificialmente baixos, predatórios, abaixo do preço de aquisição praticados por “posteiro”. Esse tipo, suspeitamente, pouco se importa com o tamanho de sua rentabilidade, mas assiste de camarote o impacto negativo para o conjunto dos Postos.

Evidente que um estabelecimento ou uma rede de postos pode estruturar uma promoção, baseada, por exemplo, em ganhos de eficiência ou em algum outro fator econômico, para estimular a venda de combustíveis como parte de sua estratégia comercial.

Em boa hora, assim, decidiu a Juíza da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Florianópolis, em resposta à ação peticionada pelo Sindicato do Comércio Varejista de Combustíveis Minerais – Sindópolis: “Defiro, assim, o pedido de tutela de urgência, para: a) determinar que o PROCON de Florianópolis se abstenha de suspender ou interditar as atividades dos postos de combustíveis, unicamente pelo critério da ‘margem de lucro de 20%’, sem análise do caso concreto, que deverá considerar todos custos envolvidos na atividade da empresa porventura autuada; b) levantar as interdições já realizadas com base nesse critério”.

Você, leitor, não concorda, mande-me seu ponto de vista e assim trocamos ideias e aprendemos.

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Edson Silva é  economista-chefe da ES Petro e ex-Superintendente de Abastecimento da ANP.

 

 

 

Justiça de Santa Catarina anula decisão do Procon – por Edson Silva

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